Fui multado duas vezes este ano pelos guardinhas de
trânsito. Sei bem que estou errado, porque estacionei em lugar proibido e não
paguei o valor que a prefeitura cobra para estacionar em via pública: área azul
rotativa. Mas ainda assim fiquei nervoso e com raiva. Então, pensei na razão
desse nervosismo injustificado e encontrei alguns fatores que me fizeram pelo menos entender a situação.
Primeiramente, não há contraprestação digna dos tributos
que pagamos. A minha cidade tem um trânsito conturbado como nas grandes
metrópoles, mas com um toque de agravante: asfalto ruim; trepidações; ruas
apertadas; vias esburacadas; falta de sinalizações horizontais; distância muito
pequena entre os semáforos; falta de grandes avenidas que liguem os polos da
cidade; calçadas pequenas; faixas de pedestres há menos de cinquenta metros de
semáforos, o que impossibilita a parada para a passagem das pessoas; dentre
outros problemas.
Em segundo lugar, o que ocorre é uma insuficiência de
investimento em infraestrutura e transporte público. Parece-me que há uma falta
de consciência dos gestores públicos no que diz respeito à mobilidade urbana,
que se tornou uma questão recorrente e urgente, pois as cidades não suportarão
a quantidade de automóveis próprios daqui a algum tempo. Sendo assim, deve-se
primar pela extensão das vias e espaços, utilizando inclusive de
desapropriações, se for necessário. Contudo, a principal medida é o
aperfeiçoamento dos veículos coletivos, proporcionando segurança, eficiência,
conforto, pontualidade, baixo custo. Se isso ocorrer, pessoas como eu serão
instigadas a utilizarem o transporte coletivo ao invés de lotarem o trânsito,
cada um no seu carro.
Há ainda no Brasil uma política econômica consumista sem
incentivo ao investimento. Vê-se concessão de crédito e redução de impostos
para aquecer a economia, mas uma destruição no bem estar da sociedade. Esse
consumo exagerado e, consequentemente, aumento da demanda pelos serviços
relacionados (garagens, lava jato, etc), gera inflação. E isso tudo unindo à
falta de contraprestação e investimento que falei anteriormente faz com que um
cidadão como eu prefira estacionar errado ao invés de pagar cinco reais por dez
minutos de estacionamento.
Além disso, não há coerência e integração entre os
governos municipais, estaduais e federal; pois à medida que este proporciona
facilidades para compra de carros, agradando a indústria automobilística, aquele
tem em suas mãos a administração de uma cidade despreparada, que torna-se
superlotada e caótica. Creio que os consórcios públicos podem ajudar solucionar
esse problema.
Por fim, tem o fator que considero mais importante: a
cultura. O jeitinho brasileiro de não seguir regra. É nesse fator que eu estou
inserido, porque estacionei em lugar proibido. Considero o fator mais
importante porque apenas com a mudança do comportamento das pessoas
conseguiremos ter um ambiente melhor para se viver. Entretanto, como seguir as
regras, com um sistema todo errado? Isso não justifica, é claro, mas ajuda a
entender as ações erradas das pessoas. Para encerrar, trata-se não apenas do
não cumprimento da regra, mas também do sistema que nos leva a transgredi-la, a
falta de alternativas. O discurso politicamente correto é fácil; complicado é
oferecer condições de vida tranquila e correta para as pessoas.